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quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

JANE AUSTEN, A VAMPIRA, de Michel Thomas Ford

A orelha da contracapa informa que o autor, Michel Thomas Ford, escreve livros juvenis, além dos adultos, e por duas vezes ganhou prêmio de Melhor Livro de Humor. A síntese  biográfica faz jus ao livro, foi uma excelente escolha para um fim de férias chuvoso, últimos dias antes de retomar a rotina de mais um ano.

Depois de ler Bram Stoker ou Anne Rice (ou tantos outros autores que trabalharam com o tema dos vampiros), a Jane Austen de Michel Thomas Ford é de uma simplicidade surpreendente. Embora a leitura seja gostosa, fiquei um pouquinho decepcionada pela ausência de alguma reflexão filosófica, de um olhar do autor sobre ... sobre... sobre a imortalidade, que fosse, ou de alguma cena sugestivamente forte, cruel, chocante ou envolvente.

Não há nada disso em JANE AUSTEN, A VAMPIRA (leio em português, na tradução de Carlos Szlak, edição de 2010 da Editora Leya).

A Jane Austen da história, uma vez transformada em vampira, forjou sua necessária "morte" para o mundo humano e, consequentemente, não pode mais usar seu famoso nome artístico, tampouco receber os direitos autorais da obra sempre famosa. Acontece que, depois disso, teria escrito mais um romance (só um?), que passou os duzentos anos seguintes tentando publicar, com o(s) nome(s) com que agora se apresentava no mundo, que resultaram em mais de 180 cartas de rejeição...

Colocado desta forma, a história segue leve, e divertida. A Jane Vampira é dona de uma livraria, e surpreendentemente humana: come, dorme, não tem problemas com a luz do dia. Até parece que dormiu nos duzentos anos que já passou viva, já que suas lembranças parecem confinadas ao período em que foi "convertida" a vampira, e mesmo assim somente porque seu criador, outro importante nome da literatura inglesa, reaparece num personagem ambíguo que tanto é herói quanto vilão. No mais, é uma história contemporânea, com uma personagem perfeitamente adaptada aos novos tempos, inobstante seus mais de dois séculos de existência. E então, nas coincidências de uma história de ficção, Jane consegue seu primeiro contrato de edição em dois séculos, com direito a um marketing tão bem sucedido que o romance é catapultado ao primeiro lugar da lista dos mais lidos do New York Times na semana de seu lançamento. Tudo, claro, junto com outros vampiros "literários" e ciumentos, que saem de seus esconderijos, mais a descoberta do amor e de amizades.

O bacana deste livro, é que a leitura deixa uma vontade de conhecer as obras dos autores ingleses citados como "vampiros" no livro (Byron e as irmãs Brontë, além da própria Jane Austen). Sempre achei que ficção é uma forma maravilhosa de começar a aprender algo novo. Terminei o livro, imaginando como seriam outras histórias no mesmo formato... "Machado de Assis, o Vampiro", ou "José de Alencar, o Lobisomem", ou até mesmo "Monteiro Lobato e seu armário de Nárnia".






domingo, 12 de janeiro de 2014

PLANETA DUPLO, de Jack Vance

Fim de ano foi tempo de rastrear em sebos, volumes antigos de ficção científica, sempre impressionada com o número pequeno de títulos disponíveis (será que, agora, essa vertente é considerada simplesmente "fantasia"? É uma hipótese, porque não concebo que os escritores simplesmente tenham abandonado a tendência, justo agora que começamos a explorar novos planetas!)

PLANETA DUPLO, de Jack Vance, é mais um livro de ficção científica das décadas 70/90. (leio em português, traução de Mário Molina, na edição de 1979, coleção Mundos da Ficção Científica da Livraria Francisco Alves Editora).

Ainda que ambientado em planetas alienígenas, a história lembra bastante as epopéias celtas: povos diferentes que disputam um terrritório relativamente pequeno, sociedades que estão a meio caminho entre um feudo medieval e pequenas cidades, títulos honoríficos e o orgulho de classe.

A história é interessante, mas o estilo de escrita é confuso.
O texto tem várias notas de rodapé e um glossário ao final, para inserir detalhes sobre o mundo imaginário alienígena. Mesmo assim, na leitura, ficou mais fácil imaginar as planícies irlandesas do quê um planeta alienígena. Então... lá no escritório, temos o ditado que diz que o difícil é fazer, porque criticar o que está feito é sempre mais fácil. Neste limite, penso que as descrições do planeta e de suas excentricidades melhor estariam inclusas no próprio texto. E no mesmo raciocínio, como ainda estou lendo contos do mesmo período, pensei se o autor não se sentiu limitado para escrever uma história longa, quando o fazia dentro de uma tendência literária onde o usual são os contos relativamente curtos. Porque num texto sintético, a mistura com um pouco de épico, um tanto de fantasia e uma pitada de romance, deixou o texto q-u-a-s-e parecendo mais um roteiro do que um romance de ficção científica.

Mas, críticas à parte, a verdade é que li a história inteira, sem cansaço, e gostei o bastante para trazer até o blog em resenha. Um texto gostoso, um personagem principal orgulhoso, mas inteligente, daqueles que enfrenta os problemas que ele mesmo cria, fazendo seu próprio destino. É assim que encontra, quase que por acaso, o vilão da história. O resultado é uma trama curiosa, onde os personagens agem de acordo com interesses próprios, mas acabam representando o "bem versus o mal" pelo impacto que tais decisões possuem em detrimento "da população", ou seja, aquele todo indistinto de pessoas/personagens que apenas existem, quase pano de fundo, na história.




sábado, 11 de janeiro de 2014

AZAZEL, de Isaac Asimov

Foi a segunda vez que li o AZAZEL, de Isaac Asimov, num volume que me foi emprestado de um amigo (e, vergonha... ainda não devolvi!). Mas, talvez, seja porque não me conformo que Asimov não seja tão genial ao escrever humor, quanto na ficção científico. (Leio em português, tradução de Ronaldo Sérgio de Biasi, 2ª edição de 1991 da Editora Record).

AZAZEL é uma sequência de contos sobre um mesmo personagem. Em síntese, o próprio Asimov fez-se personagem, e como tal regularmente convida seu amigo George para jantarem em algum bom restaurante. Sempre tem que pagar a conta, o amigo jamais divide e ainda considera um desaforo a ideia de pagar pelo próprio consumo, mas o faz de bom grado em troca das boas histórias que o amigo confidencia após tomar um número regular de taças de vinho.

As histórias são sobre AZAZEL, um desastrado demônio de dois centímetros que apenas George consegue invocar. A pretexto de ajudar amigos, George usa tais poderes tentando tirar proveito pessoal, mas sempre termina em algum imprevisto desastre.

Assim, o livro reúne dezoito pequenos contos de humor, que mostram uma faceta diferente de Isaac Asimov, agora como escritor de fantasia. Mas o que me deixa curiosa, é que toda vez que leio as histórias, fico com a sensação de que Asimov está "desabafando", com alguma ironia, uma situação pessoal ou de um desafeto. Não encontrei informações para corroborar tal impressão, só a sensação da leitura, de que os personagens, de alguma forma, são todos baseados em pessoas ou em situações reais. Vai saber?



REALIDADES ADAPTADAS, de Philip K. Dick

Porque alguns autores alcançam notoriedade, enquanto outros são relegados ao esquecimento?

Ano passado (que pela primeira vez vi editado em português) encontrei num sebo que pouco frequento, quatro revistas antigas do Isaac Asimov Magazine (volumes 8, 9, 10 e 19). Comprei para ler aos poucos, contos e mais contos interessantes, a maioria de autores de que nunca tinha ouvido falar. Mais de uma vez, pensei... quanta gente já escreveu ficção científica! E quão pouco conheço! Com o ano chegando ao fim, encontrei o livro REALIDADES ADAPTADAS, contos de PHILIP K. DICK (leio em português, tradução de Ludimila Hashimoto, editado em 2012 pela Editora Alep Ltda, São Paulo).

O livro é quase uma homenagem ao autor, falecido em 1982, aos 52 anos, três meses antes do lançamento do primeiro filme baseado em sua obra. Que, aliás, era nada mais, nada menos, que Blade Runner, o Caçador de Andróides - um cult da minha juventude, um filme que adorei e assisti mais de uma vez -. Só isso já era suficiente para que levasse o livro para casa, mas não era só. A apresentação e comentários destacam que os contos de PHILIP K. DICK foram base de vários filmes intrigantes, todos de ficção científica, que assisti, gostei, fizeram pensar, citando entre os sucessos de bilheteria, O Vingador do Futuro (1990), Minority Report - A Nova Lei (20020), e O Vidente.

Porque assisti aos filmes, o livro ficou ainda mais interessante.
Porque são CONTOS, mesmo, assim como aqueles publicados na revista de Asimov, relativamente curtos, instigantes, provocadores, interessantes.

Cada um dos sete contos reunidos, vem precedido de uma breve referência sobre o filme que originou. E os filmes não foram (como estou acostumada a comparar) adaptações da literatura para a película. Fica muito fácil, depois de ler tais contos, entender a diferença entre ADAPTAÇÃO e ROTEIROS, este último no verdadeiro sentido do termo, ou seja, uma obra nova, uma criação a partir da ideia central do conto, com as modificações específicas para a linguagem do cinema.

Em REALIDADES ADAPTADAS estão reunidos sete contos que posteriormente foram base de populares filmes de ficção científica, a saber Lembramos para você a preço de atacado, publicado em 1966 (O Vingador do Futuro/Total Recall, primeira versão de 1990), Segunda Variedade, escrito em 1953 (Screamers, Assassinos Cibernéticos, filme homônimo lançado em 1995), Impostor, publicado em 1953 (filme homônimo lançado em 2001), O Relatório Minoritário, conto escrito em 1956 (Minority Report, A Nova Lei, filme lançado em 2002), O Pagamento, publicado em 1953 (Paycheck, filme lançado em 2003), O Homem Dourado publicado pela primeira vez em 1954 (O Vidente/Next, lançado em 2007), e Equipe de Ajuste, escrito em 1954 (Os Agentes do Destino/The Adjustment Bureau, filme de 2011).

O livro tem ainda um último, e curto, capítulo, reunindo notas explicativas do próprio autor. Estas notas haviam sido solicitadas, à época, pelos próprios editores, para serem incluídas nas coletâneas como uma visão do autor, sobre seu próprio texto, um costume nas edições da época.

De todos os contos, escolho como preferido  O Homem Dourado, 1954 (O Vidente/Next, filme de 2007). Amei a ideia do (lindo!) "homem dourado", o personagem central, que é um humano/mutante, em uma  história que questiona o próximo passo evolutivo da raça humana. Isso foi subtraído no filme, onde o personagem central é apenas um humano paranormal, um "vidente".

Fiquei feliz, portanto, ao terminar de ler os contos e descobrir que O Homem Dourado também era a história que recebeu mais comentários do autor. Fiquei sabendo, então, que John W. Campbell Jr, o editor de uma famosa revista de ficção científica, de nome Analog, só publicava contos onde os mutantes fossem seres bondosos, evoluídos e senhores da situação - como o são, por exemplo, todos os super-heróis com superpoderes, inventados por autores diversos no mesmo período. Os contos de DICK foram rejeitados por esta revista.

Assim, em suas notas, PHILIPH DICK faz uma reflexão, expondo as razões pelas quais discorda dos aspectos emocionais envolvidos no que chama de "poderosa fantasia". Entende, inversamente, que nós/humanidade tenderíamos a receber com estranheza e agressividade o surgimento de "mutantes", e que, a médio prazo, eles se tornariam essencialmente perigosos. Isso, porque o autor não vê lógica em supor que nossa humanidade "evoluída" pudesse ter real interesse em proteger, dirigir ou beneficiar uma versão tosca de sua própria evolução.